AS VISÕES MODERNA E CONTEMPORNEA SOBRE SERTÃO E POLÍTICA
- César Plaggert
- 15 de nov. de 2023
- 3 min de leitura
O sertão e os cangaceiros são temas recorrentes na cinematografia brasileira, atravessando diversas décadas e fluindo em diversos gêneros e estéticas de direção. Nessa crítica, será abordado os filmes Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro (1969) de Glauber Rocha e Bacurau (2019) de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, dois longas que mesmo que compartilhem da mesma temática, constroem suas obras de formas diferentes.
Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro (1969) foi filmado em um dos períodos mais violentos e opressivos do Brasil, a ditadura Costa e Silva, conhecido pela forte censura, perseguição às classes artísticas, políticas e jornalísticas. Glauber Rocha, com esse contexto sócio-político, elabora um filme sob a ótica marxista que aborda uma crítica ao capitalismo, mostrando a luta de classes entre o coronel(grandes dono de terras) e o povo pobre, colocando os cangaceiros como transformadores sociais e figuras de esperança para aqueles que não possuem forças para lutar. Devido ao perigo da censura, o diretor trouxe em sua mise en scène e nos diálogos, metáforas e simbolismos para expor sua visão de mundo.

Sobre a parte técnica do filme, o que mais chama atenção é a direção de arte, que aglutina os simbolismos das crenças religiosas e cultura do cangaço em uma ambientação realista nas moradias e vestimentas, acompanhada de uma coloração que dá foco ao vermelho, a cor da violência e fúria, temas recorrentes no longa. A cena que mais chama atenção pela direção de arte, é a apresentação de Coirana e seu bando, em que no enquadramento todas as cores dialogam entre os personagens e as vestimentas deles apresentam símbolos que são característicos da cultura e crença religiosa do nordeste, uma verdadeira fusão do sertão. Esse tipo de direção de arte é característico do movimento que o diretor fazia parte, o “Cinema Novo”, movimento esse que buscava retratar as belezas e dificuldades de nosso país em um experimentalismo estético e narrativo.

Já Bacurau, foi lançado no primeiro ano do Governo Bolsonaro, em que os brasileiros estavam apreensivos com o governo liberalista de extrema direita que estava por vir, gerando medo e paranoia por aqueles que conhecem a história do Brasil. Kleber e Juliano inseridos neste contexto, diferente de Glauber, constroem uma crítica mais direta à política do período, em que um prefeito à mercê de Estadunidenses ricos, torna a cidade de Bacurau um território de caça. O longa mostra a importância da ancestralidade, memória e união de um povo num momento de perseguição, em que os moradores locais, mesmo com diferentes idades, unem forças com o bando de bandidos do Lunga, para se vingar dos assassinos, usando armas dos antigos cangaceiros da cidade.
O que mais chama atenção sobre a estética de Bacurau, é a escolha de manter a câmera em um ritmo mais lento, com raros momentos de movimentação, uma escolha artística que também é diferente de Glauber, que usa a câmera para gerar um estado frenético. A decisão dos diretores gera uma contemplação maior do público aos planos fotográficos, em que reparamos com clareza os detalhes da cena, como no momento em que o povo de Bacurau está se despedindo da avó de Tereza, sendo possível reparar na expressão de tristeza de cada pessoa no local.

Mesmo que Bacurau e Dragão da Maldade contra o Santo Guerreiro, estejam em contextos sócio-políticos, abordagens técnicas e estéticas diferentes, ambos possuem características em comum, que é uma ambientação do sertão de forma realista, mostrando a situação de falta de acesso a mantimentos e opressão sofrida, e também a ousadia em criticar diretamente um sistema industrial injusto e um governo opressor, usando a arte para dar voz para aqueles que foram calados.
Texto: César F.P. Falkenburg
Revisão: Alice Faria
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