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Crítica | 'Suçuarana': o metamórfico meio do caminho

A geografia como modificador do campo psicológico: o cinema que se insere em um corpo físico para fluir em uma jornada entre diferentes locais e sentimentos. É a partir desse segmento que se formam os road movies, um subgênero amplamente utilizado na filmografia mundial, pois é essencialmente humano estar em busca de algum objetivo. Com base nesse formato, Suçuarana (Clarissa Campolina, Sérgio Borges, 2025), como obra pós-moderna, experimenta a flexibilidade dos códigos oferecidos por produções anteriores para desenvolver sua própria experiência cênica, induzida por um Brasil fragilizado pela sua ordem social.

Suçuarana cede o atributo central presente nos road movies: alcançar um lugar. Porém, torna-se essencialmente interessado no desenvolvimento, no metamórfico meio do caminho, entregando ao espectador apenas fagulhas de uma história que extrapola os limites da duração de um filme. É curioso que a obra ressoe em seu recorte narrativo, inserindo a protagonista em um grupo de pessoas que também estão no meio da estrada e que, ao unirem seus fragmentos, formam um corpo coletivo, aliviando-os de suas trajetórias solitárias.


Frame do filme Suçuarana (2025)
Frame do filme Suçuarana (2025)

Para transpor seu caráter místico e fragmentado, Campolina e Borges utilizam a decupagem e a iluminação como principais ferramentas. A câmera constantemente capta Dora com lentes teleobjetivas, distantes, em enquadramentos que recortam seu corpo, revelado aos poucos por movimentos de câmera. Do mesmo modo, a iluminação privilegia a presença de luzes diegéticas, que iluminam parcialmente os objetos, escondendo-os em sombras. A construção de uma ambientação orgânica favorece a conexão sensorial com esse universo incompleto, afastando-se de uma observação racional sobre os acontecimentos apresentados.

Destaca-se também a escolha das locações, fundamentais para sua proposta estética, situadas no espaço rural, reconhecido culturalmente por seu folclore e causos. A atmosfera mística do interior é assumida narrativamente, com duas figuras de destaque: o cachorro Encrenca, que surge e desaparece em diversos momentos da trajetória de Dora, e a dança ritualística composta por máscaras, instrumentos de percussão e oferendas. Os realizadores compreendem que o fantástico anda lado a lado com a realidade, compondo um espaço essencial para a manutenção das tradições culturais.


frame do filme Suçuarana (2025)
frame do filme Suçuarana (2025)

Suçuarana propõe uma nova forma de pensar os road movies, em que o contexto sociopolítico é tão importante quanto o objetivo pessoal para a construção da trama. O escapismo revela-se uma ação de proteção em uma sociedade que reduz a protagonista apenas ao seu gênero, oprimindo sua liberdade de alcançar um estado de calmaria. Mesmo sozinha na estrada, nunca estará plenamente segura para ser ela mesma.


Suçuarana é distribuido pela Embaúba Filmes e estreou em 11 de setembro


Texto: César F. P. Falkenburg


 
 
 

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