VIAGENS FÍLMICAS: Amor à Flor da Pele
- César Plaggert
- 26 de mai.
- 2 min de leitura
Atualizado: 26 de ago.
Em um domingo frio, reencontrei Amor à Flor da Pele pela quarta vez, uma obra com a qual compartilho encontros e desencontros, pessoais e urbanos. Em três anos deste relacionamento, filmei e escrevi muitas coisas, formei e desfiz amizades, amei e me desiludi, me excitei e chorei, uma vida de intensidades dignas de uma letra de bolero. Não chego a me arrepender de nada, mas toda vez que reassisto à obra de Wong Kar-Wai, retornam memórias, como em uma bobina de cinema com alguns quadros queimados, em que engulo seco e cerro os olhos, tomados pelos créditos finais em tom vermelho.
Tive a oportunidade de participar de uma sessão com sonorização ao vivo no REAG Belas Artes, que, mesmo sendo às 20 horas, estava tomada de românticos, cinéfilos, saudosistas e curiosos como eu. Mesmo que os músicos tenham interpretado as composições de uma maneira diferente, o melodrama ainda tomava conta da sala de cinema, com aquele violino agudo da música-tema e aquelas frases em espanhol sussurradas ao meu ouvido. Quase surgiu um cigarro em minha mão e um terno em meu corpo, me levando novamente a sentir melancolia, motivação, alegria e, principalmente, saudades guardadas de outras sessões. Saudades das pequenas vidas que vivi com aquele filme, que guardo também no meu bolso, como segredos a serem escondidos algum dia, em algum lugar.

É curioso que, quando você assiste a um filme pelo qual tem grande carinho, a experiência cinematográfica ultrapassa a sala de exibição e te acompanha por toda a trajetória de volta para casa. Coloquei a trilha sonora da obra para ouvir no metrô, ainda imerso no melodrama de Kar-Wai, me imaginando sendo filmado em câmera lenta, enquadrado refletido em espelhos e sonorizado por músicas combinadas de tesão e tristeza. Que prazer é viver uma fantasia distante da poluição sonora e visual de São Paulo, uma tragada de arte e um suspiro de paz.
Amor à Flor da Pele mostra que, em uma sociedade de aparências, de cabelos engomados e vestidos elegantes, corredores escondem desejos, a chuva mascara a verdade e becos anunciam um fim próximo. Olhares, frases simbólicas e ações de carinho explicam o amor muito mais do que um beijo intenso, do que corpos nus suados ou por declarações românticas.

O cinema tem o poder de transformar casais silenciados em um grande romance: se a Hong Kong da década de 60 os impediu de ficarem juntos, na Hong Kong dos anos 2000 eles são amados, desejados e referenciados por uma legião de pessoas que entendem a dor de amar.
Texto: César F. P. Falkenburg
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